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Capítulo 4: A Crescente Controvérsia

Embora Orígenes fosse um dos teólogos mais influentes dos séculos III e IV, é natural que também tivesse inimigos que se opunham a várias coisas que tinha ensinado. Com efeito, sempre que alguém se encarrega de esclarecer uma grande diversidade de tópicos bíblicos, também haverá pessoas que se ofendem com cada novo tópico que é tratado.

No livro How to be a Bishop without Being Religious (Como ser um Bispo sem Ser Religioso), Charles Merrill Smith dá conselhos aos ministros cristãos para que se abstenham de ensinar doutrinas, pois isso apenas divide as pessoas em grupos e sempre dividirá a igreja. Esse conselho é seguido por muitos, resultando em maior unidade às custas do conhecimento das Escrituras. No entanto, meu conselho é desenvolver tanto o fruto do Espírito quanto o conhecimento bíblico, pois esse é o verdadeiro caminho para a unidade sem sacrificar a verdade. As pessoas cheias de ira e vingativas amiúde irão impor a unidade pela força, a despeito do quanto ensinem; ao passo que aqueles que são semelhantes a Cristo alcançam a unidade através do amor, da bondade e da humildade.

O quarto século chegou ao seu fim, e os grandes Universalistas da época morreram e descansaram em paz. Infelizmente, muitos bispos cristãos passaram tempo insuficiente cultivando os frutos do Espírito e tempo excessivo acumulando dinheiro e poder. Durante a maior parte do século IV, a controvérsia ariana sobre se Cristo era ou não um ser criado, trouxe a prática de realizar Concílios da Igreja para decidir o que era verdade e o que era heresia pelo raciocínio da mente carnal. Os "hereges" eram tratados tão mal quanto foram tratados os cristãos pelos imperadores romanos no auge das perseguições.

A opinião do grande Gregório Nazianzo, bispo de Constantinopla, chamado “O Teólogo”, está registrada nas páginas 178 e 179 de The Ancient History of Universalism, (A Antiga História do Universalismo) de Hosea Ballou,

    "Ele condenou a capciosidade dos fanáticos zelosos sobre pontos doutrinários ... O clero daquele época, ele ousadamente, e parece merecido, caracterizou como uma classe de homens avarentos, briguentos, licenciosos, e em uma palavra, sem princípios; e dos frequentes concílios que então perturbavam a paz da igreja, declarou que tinha medo deles porque nunca tinha visto o desfecho de um que tivesse sido feliz e agradável, ou que não aumentasse o mal em vez de diminui-lo."

Gregório de Nazianzo morreu em 390. O outro Gregório, bispo de Níssa (irmão de Basil), morreu em 394 ou 395, perto dos sessenta anos de idade. Dídimo, o Cego, que ficou cego aos cinco anos de idade, mas depois tornar-se o presidente da grande Escola Catequética de Alexandria (cargo ocupado por Orígenes um século antes), também morreu em 395, próximo aos noventa anos. Tito, bispo de Bostra, já havia falecido algum tempo antes.

Havia novas estrelas em ascensão na igreja naqueles dias. O erudito, Jerônimo, bispo de Belém, embora mordazmente vingativo, era um grande linguista e tradutor de cartas e das Escrituras. João Crisóstomo, o bispo orador de Constantinopla, viveu até 407. E, finalmente, no ocidente, Agostinho converteu-se do cristianismo para maniqueísmo em 388 e foi ordenado bispo de Hipona, perto de Cartago, no norte da África. Ele viveu até 430.

Com a expulsão dos arianos (os seguidores de Ário) no século IV, que haviam negado a trindade, a igreja agora tinha tempo de procurar outras heresias para reprimir. Assim como as guerras mundiais modernas, que começam pequenas e locais e depois crescem à medida que cada lado ganha adeptos, a controvérsia universalista também começou pequena no ano 391.

Naquele ano Epifânio, bispo de Chipre, visitou Jerusalém onde João Crisóstomo era bispo. João era um admirador de Orígenes, porém Epifânio se opôs fortemente aos ensinamentos de Orígenes. Como cortesia, João convidou Epifânio falar à igreja em Jerusalém. Epifânio, entretanto, usou a ocasião para atacar Orígenes e reprovou João por permitir heresia em seu meio. Quando ele prosseguiu nessa linha de pregação, João enviou seu vigário-geral em frente toda a igreja para pedir-lhe que cessasse o ataque. Após a reunião, as discussões acaloradas continuaram centrando-se principalmente na crença de Orígenes de que a ressurreição não era corporal.

Alguns anos mais tarde, Epifânio novamente veio a Jerusalém, mas permaneceu em um mosteiro a 32 quilômetros ao ocidente. Naquela época, o irmão de Jerônimo, Pauliniano, chegou a Belém a negócios. Epifânio manda que ele seja apreendido, amarrado e amordaçado, e depois o ordena diácono pela força – uma prática não incomum naqueles dias.

Vendo que Epifânio estava fora de sua jurisdição, isso ofendeu João Crisóstomo, que furiosamente reclama da violação de protocolo. Lembre-se que essa foi a mesma reclamação feita pelo bispo de Alexandria quando os bispos de Cesareia tinham ordenado Orígenes. João ameaçou escrever cartas de reclamação a todas as igrejas, e a notícia chegou aos ouvidos de Epifânio, que nessa época havia retornado a Chipre.

Epifânio objetou que a reclamação de João não era realmente sobre essa violação de protocolo, mas sobre a disputa origenista. Em 394, Epifânio publicou a primeira censura sobre o universalismo que temos registrada. Hosea Ballou escreve sobre isso na página 215,

    "Dissemos que nessa passagem ocorre a primeira censura que se encontra em toda a antiguidade contra a doutrina do Universalismo. Devemos observar, entretanto, que mesmo aqui a censura cai, como o leitor pode perceber, não sobre a doutrina da salvação de toda a humanidade, mas sobre a da salvação do diabo."

Epifânio enviou cartas também aos outros bispos da Palestina, não somente a João, que acabou por dividi-los em campos opostos. O resultado mais importante, talvez, foi que Jerônimo de Belém ficou do lado de Epifânio, apesar que, até aquele momento, ele havia ensinado claramente a salvação de toda a humanidade em seu Comentário de Efésios e em outras obras. Mas, Jerônimo queria apoiar a ordenação de seu irmão, Pauliniano, que havia sido ordenado por Epifânio (sob compulsão). Dessa forma, Jerônimo privou-se de sua comunhão com João de Jerusalém e, na verdade, traduziu a carta de Epifânio para o latim a fim de aumentar sua circulação.

Isso, por sua vez, causou uma ruptura notória com o erudito Rufino, amigo de longa data de Jerônimo, com quem havia estudado as obras de Orígenes sob a tutela de Gregório Nazianzo em Constantinopla, bem como sob a tutela de Dídimo, o Cego, em Alexandria. Desse modo, a guerra origenista se expandiu.

Não demorou muito para que as notícias dessa guerra chegassem a Alexandria. Isidoro, o protetor ancião de Orígenes, logo entrou no cenário da batalha com uma carta encorajadora para seus irmãos na Palestina. Em seguida, ele levou cartas de seu arcebispo, Teófilo, tanto para João como para Jerônimo. Dois meses depois, o próprio Teófilo foi à Palestina para emprestar sua força à disputa e estender sua influência na Palestina.

Isidoro descobriu que seus velhos amigos em Belém haviam se voltado contra Orígenes, e por isso tomou o partido de João de Jerusalém. No entanto, a maior parte das disputas origenistas nessa época se concentrava em torno das opiniões dos teólogos sobre a pré-existência, a trindade, a ressurreição do corpo e a salvação do diabo e seus anjos.

Enquanto isso, Rufino e Jerônimo conciliaram suas diferenças, comprometendo-se a evitar os ataques um ao outro. Assim, Rufino navega para Roma, onde publica uma tradução latina de Os Princípios, de Orígenes. Ele também assume a responsabilidade de mudar ou deixar de fora algumas declarações de Orígenes que sabia que seriam ofensivas, alegando mais tarde que tais passagens foram acrescentadas ou corrompidas por hereges.

Mas, não parou por aí. Rufino faz referência a um "idôneo irmão" anônimo (ou seja, Jerônimo) que também havia admirado imensamente a Orígenes, apontando sua inconsistência ao fato de que agora estava caluniando Orígenes. É claro que Jerônimo não resistiu a dar uma resposta, e logo a ruptura ficou pior do que nunca: dois grandes eruditos em uma rixa pública, cada um apontando as inconsistências do outro.

Mais que qualquer coisa, essa ruptura entre Jerônimo e Rufino ampliou uma controvérsia local para uma guerra em larga escala dentro da igreja cristã.